Forno em recuperação pela autarquia brigantina traz recordações de Páscoas passadas em tertúlias femininas
Durante décadas, o Forno Comunitário de Pão, mais conhecido como o Forno da Ti Glória, serviu a centenas de senhoras, para não dizer milhares, de ponto de encontro, de convívio, de reunião e de festa. O nome perdurou devido à senhora que, durante todo o ano, para além de cozer o pão, morava no forno, situado no bairro de Além do Rio, como nos conta Helena Morais.
“Na altura, estava lá a senhora Glória a viver, que era a dona do forno. A gente pagava-lhe qualquer coisa em dinheiro por fazer lá os folares. Uma parte era o forno, outra parte estava reservada para ela, com quarto, cozinha e assim”, afirma. Quanto à importância paga pelo uso do forno à Ti Glória, Helena não consegue especificar, mas recorda que era uma insignificância.
“Pagavamos-lhe muito pouco! Ela era uma pessoa muito simpática, contava lá muitas histórias e passávamos todas um bom bocado. Era uma grande senhora”, relembra.
Em época de Páscoa, as tertúlias aconteciam naturalmente. Sem aviso prévio, as mulheres impulsonadas pela necessidade de cozerem os folares, encontravam-se, efusivamente, no Forno Comunitário. “Eu e as vizinhas, juntávamo-nos todas no forno por altura da Páscoa. E não éramos só nós! Vinham pessoas de todo o lado... Das Moreirinhas, (bairro) dos Batocos, da Vila, daqui de Além do Rio. Toda a gente ia ao forno. Era de noite e de dia, na Semana Santa, o forno sempre a cozer”, narra em nostalgia.
Helena Morais descreve com saudade e boas recordações aqueles tempos místicos de outrora nos finais da década de 70. Depois da Ti Glória falecer, o forno acabou. O tempo e o abandono acabaram por degradar a estrutura do edifício em ruínas, obrigando quase que ao esquecimento da memória colectiva brigantina.
Na época Medieval, o forno de Bragança era considerado como sendo o maior de Portugal
“Eu gostava muito de vir cá ir cozer o folar para ali porque era uma alegria. Era uma festa! Juntava-se cá muita gente, cada uma dizia sua coisa. Estávamos aqui todas de noite e de dia, de noite e de dia. Sinto muito falta daquele tempo!”, assegura, com um saudosismo muito próprio que transparece no rosto.
Com 65 anos, Helena, tem, agora, um forno em casa, onde aproveita para fazer os folares. “Mas há muita gente que se vê aflita, pois não tem forno e tem de ir para as padarias. É diferente”, reconhece. “Na altura, havia pessoas que já traziam os folares de casa nas latas e chegavam aqui e era só cozer! Mas havia outras pessoas que não sabiam amassá-los em casa e faziam-no aqui no forno com alguma ajuda”,
Certos historiadores, admitem mesmo tratar-se do maior forno existente na época Medieval, em Portugal, tendo sido edificado para cozer o pão aos trabalhadores das obras de construção do Castelo de Bragança.
Recorde-se que, o Jornal Nordeste, na edição de 1 de Fevereiro, noticiou a decisão da Câmara Municipal de Bragança, que adquiriu o Forno Comunitário de Pão em 1991, em promover a sua recuperação. Um investimento na ordem dos 110 mil euros, integrado no projecto “Bragança Activa”, cuja premissa se baseia na revitalização da zona histórica da capital de distrito.
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