Travadas várias batalhas por mais de 10 anos numa autêntica guerra judicial, autarquia é vencida mas tarda em obedecer aos tribunais
Um casal construiu, em 1998, um prédio de dois andares no lote 44, Rua A, do Bairro Artur de Mirandela. O imóvel, concluído em 2000, nunca obteve a licença de habitabilidade. Isto porque, não existe ligação ao esgoto nem à água da rede pública. Entretanto, em 2003, a filha do casal, por necessidade, mudou-se para o prédio inacabado, vendo-se obrigada a usar uma fossa céptica e água proveniente de um furo.
Um pedido feito à Câmara Municipal de Bragança, sobre a ligação ao colector geral de saneamento, realizado na pessoa de Carlos Pereira e Filomena Teixeira, viu-se deferido pelo anterior executivo, presidido por Luís Mina, mas continua a ser negado pelo actual. A obra permanece, portanto, embargada, à espera de uma decisão autárquica consentânea com a dos tribunais, “pois esta já deveria ter sido tomada há muito pela Câmara e não prolongada no tempo”, refere o queixoso.
“Em 1998, foi aprovado pela Câmara Municipal de Bragança um plano para a construção de um edifício que daria para a estrada nacional 15 e que foi executado rigorosamente conforme a planta, ou seja, com sub-cave, cave, rés-do-chão e primeiro andar e sótão”, esclarece Carlos Pereira, proprietário do prédio em questão. Após a sua conclusão, em Agosto do ano 2000, dirigiu-se à autarquia para efectuar um pagamento de 86 mil escudos (430 euros) respectivo à ligação dos esgotos à Estrada Nacional 15. Os técnicos foram, posteriormente, enviados à obra e dada a autorização para esta ligação, incluída no projecto desde o seu início. Uma ligação que, em principio, não levantaria quaisquer questões, dado que os tubos de saneamento necessários passariam por terreno público, um que separa o prédio em questão da EN15.
Nesse mesmo ano, Carlos Pereira conta como ficou “embaraçado” ao descobrir que, depois de adiantar obra, colocando os tubos de esgoto no subsolo, “um particular começou a desterrar acabando por rebentá-los, destruindo o trabalho já realizado”, adianta. Ao tentar esclarecer o imbróglio, foi-lhe manifestada pela câmara a intenção de ser construído um edifício no tal terreno “dito público”. Caso fosse concretizada, teria de haver alterações ao projecto inicial, “algo absurdo”, afirma o proprietário, que “não teria avançado com o projecto se este não fosse conduzido como estava inicialmente previsto”. Contratou um advogado e a obra foi embargada de imediato por ordem do Tribunal de Bragança.
Carlos Pereira e Filomena Teixeira interpuseram, deste forma, uma acção no Tribunal Administrativo, o qual decidiu a favor do casal, reafirmando o facto do terreno ser público. Entretanto, o particular que queria construir naquele terreno da EN15 ainda recorreu da decisão, mas, nesta ocasião, foi o único, já que, a Câmara se absteve de interpor recurso. O tribunal de última instância deu também razão a Carlos Pereira reafirmando que naquele terreno não poderia ser construído nada de interesse privado. Assim sendo, por douta decisão, o terreno público iria, de facto, permanecer público.
“Depois dos tribunais, temos insistido, por diversas vezes, com o presidente da câmara, Jorge Nunes, para efectuar o saneamento conforme previsto, pago no ano 2000, e podermos, assim, obter a licença de habitabilidade. No entanto, as suas iniciativas passaram, já após ter perdido em tribunal, por enviar não uma, mas três vistorias ao local, “no sentido de encontrar algo anómalo e que, de repente, lhe pudesse dar razão, coisa que não aconteceu”, defende o Carlos Pereira. Numa das vistorias ainda foi sugerido ao proprietário que fizesse a ligação dos esgotos à Rua A, uma solução que no seu entender não é tecnicamente viável, pois esta rua encontra-se numa cota superior, ao contrário da EN15, e mesmo um motor que daria para puxar os dejectos sólidos, traria certamente problemas no futuro, sendo que esta é uma solução também inviabilizadora economicamente, não constando sequer no projecto inicial.
“Outras habitações há, contíguas à de Carlos Pereira, mais concretamente, a 14, 16 e a 36, que têm as suas ligações de esgotos conectadas com a caixa da EN15”, refere o entrevistado.
A Carlos Pereira esgotou-se-lhe a paciência, não esperará mais por uma resposta de Jorge Nunes e avançará com um processo de responsabilidade civil contra o autarca, por este não dar seguimento ao aprovado anteriormente pela câmara municipal, nem mesmo após 10 anos em tribunais, quando estes sempre deram razão ao munícipe.
“Câmara tem de cumprir”
Luís Mina, anterior presidente da Câmara Municipal de Bragança, eleito por dois mandatos, de 1990 a 1998, presta o seu testemunho ao Jornal Nordeste, asseverando que, a actual câmara ao ter licenciado a construção, devia ter assegurado também a realização das infra-estruturas que por ali era suposto terem passado. “A autarquia não pode, nem deve, é afirmar que o saneamento devia fazer ligação com a Rua A, até porque essa opção nem constitui uma solução”, refere.
“É da sua inteira responsabilidade, utilizar para o lote de cima (prédio de Carlos Pereira) o mesmo sistema que foi implementado nos lotes contíguos, nomeadamente, no de Amadeu Pires, ou seja, a ligação do saneamento à EN15”, adianta o ex-presidente.
“Este problema de ligação ao colector geral de saneamento poderia já ter sido facilmente resolvido pela câmara. Carlos Pereira, só tem de exigir ao tribunal a execução da sentença, uma que a câmara já deveria ter cumprido”, conclui Luís Mina.
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