24 de setembro de 2009

TENSÃO NO SEIO DA GNR

O momento não tem sido de grande serenidade, sobretudo, desde Janeiro, com a extinção da Brigada de Trânsito e culminando com ácido no radar fotográfico, fala-se em pressões

Ao que o Jornal Nordeste conseguiu apurar, muitos dos militares da extinta Brigada de Trânsito (BT), integrados no Comando Territorial de Bragança, estão descontentes com a precariedade da sua actual situação. Terá sido por esse motivo que, há pouco mais de uma semana, um radar fotográfico, instrumento utilizado por militares na fiscalização do tráfego rodoviário, foi danificado com ácido no próprio parque das instalações da Guarda Nacional Republicana (GNR), onde é habitualmente guardado, dentro da mala de uma viatura caracterizada. Dado como inoperacional, amostras do líquido foram entregues à Polícia Judiciária Militar, responsável por investigar um caso que poderá estar relacionado com o mau ambiente que se vive actualmente no seio da GNR.
“O trânsito antes tinha um comando único, de onde vinham fichas técnicas e directivas, destinadas ao efectivo de todo o país. Agora, isso não acontece”, refere um militar da GNR. “Actualmente, cada comando distrital pode ter uma interpretação diferente daquilo que é a lei, e que deveria ser igual para todos. Não faz sentido. Estamos no mesmo país, que não é assim tão grande, por isso, é importante que haja a nível nacional e com uma matéria tão delicada, um só entendimento, como acontecia antes de Janeiro, altura em que a Unidade da Brigada de Trânsito foi extinta”, remata.

“Assistência nas marcas demasiado cara”

No aspecto logístico, reside a maior diferença, defende fonte interna. “Antes desta remodelação, todas as viaturas eram assistidas na marca, ao contrário do que acontece no presente, por decisão do Tenente-Coronel Fernandes. Tínhamos contratos de assistência e nunca tivemos o mínimo de problemas com reparações. Dessa forma, as coisas funcionavam. Hoje, em nome da poupança, retira-se segurança profissional ao efectivo, pois em perseguições ou escoltas, onde se atingem grandes velocidades, pneus sem qualidade comprometem a segurança dos nossos militares.”
“O tenente-coronel, penso que por opção, segue a lógica do investimento mínimo possível, tendo decidido que a manutenção das viaturas se efectuasse no quartel, onde dispomos de 2 mecânicos e um electricista auto, sem as condições exigidas para lidar com problemas de maior. Eles vão remediando e até são úteis no caso de pequenas avarias”, argumenta fonte anónima, realçando que o seguimento desta política, poderá ter custos elevados e causar potenciais vítimas.

Quando questionado sobre as multas e se há, de facto, pressões por parte do comando, no sentido de se atingirem determinados números, a nossa fonte é peremptória em afirmar que, “pressões há sempre, ao contrário do que é normal sair para fora. Não dizem às pessoas, de forma directa, que têm de fazer X multas, mas nós sabemos como é que essa pressão é feita internamente. Como sabemos também o tratamento diferenciado que é dado a um militar que passe mais multas do que a outro que passe menos. Desde a extinção da BT, as multas caíram cerca de 80%. Tivemos várias reuniões onde isso foi debatido e instruções precisas, no sentido de nos ser exigido cumprimento na questão das multas”.
Segundo a nossa fonte no interior da GNR, havia 7 ou 8 militares credenciados que, habitualmente, andavam com o radar. Alguns, como forma de mostrar o seu descontentamento, deixaram de apresentar os números habituais, como consequência, o comandante retirou-os dessa função, substituindo-os por 3 ou 4 homens da sua confiança. “A esses militares, como forma de incentivo, é-lhes concedido um sistema de folgas diferente do restante efectivo”. Estes elementos, declara, chegam a ter em média, 10 a 11 folgas mensais, enquanto que uma patrulha regular tem apenas 5 ou 6 folgas por mês”, termina.

Militares da BT sem formação desde Janeiro

“Antes, estávamos mais actualizados, havia directivas difundidas a nível nacional pelo Comando da Brigada de Trânsito, o que fazia com que houvesse uma uniformização na própria forma de interpretar a legislação rodoviária. Hoje não existe formação”, revela um militar da GNR.
Uma falta confirmada por José Alho, responsável pela Associação Sócio-Profissional Independente da Guarda, em entrevista ao Jornal de Notícias, "Os militares da BT não têm formação desde Janeiro, não se sabe até onde isto irá parar”, e que preferindo não se manifestar sobre o radar danificado com ácido, salienta "este caso concreto é revelador do mal-estar que se vive. São atitudes de desespero motivadas pela extinção da Brigada de Trânsito – que considero um erro político".
No entanto, o PS recusou as críticas inerentes à extinção da BT e qualquer alteração à Lei Orgânica da GNR, garantindo que a criação da Unidade Nacional de Trânsito permitiu melhorar a operacionalidade e em nada "beliscou" os direitos e regalias dos militares.


Orgulho ferido e perda de prestígio

“O ideal seria arranjar uma forma para que o trânsito fosse comandado a nível nacional, ou seja, que houvesse uma unidade de trânsito, pois aquilo que ficou criado, a Unidade Nacional de Trânsito (UNT), que só integra cerca de 200 homens, em Lisboa e Porto, em nada os diferencia do resto dos destacamentos, a não ser que eles tem um comando da UNT e nós estamos dependentes dos comandos territoriais de cada distrito”, assegura fonte interna da GNR.
“O serviço perdeu qualidade, o mal-estar entre militares está instalado, e estamos a deixar cair cada vez mais aquilo que era a unidade de elite da GNR. E a prova disso é que a GNR, neste momento, porque quis controlar o trânsito, perdeu para a PSP determinadas áreas, que eram da exclusiva responsabilidade da BT”, refere o militar, exemplificando, “na Operação Verão Seguro, antes responsabilidade da BT, vimos agora a PSP nas televisões e na comunicação social a dar entrevistas sobre como estava a correr a operação. Para nós, que tínhamos orgulho em ser da BT, obviamente que não nos agrada, outra situação foi a deslocação do Presidente da República a Santarém com escolta da PSP, uma situação impensável há um ano atrás. Estamos a assistir a uma perda de prestígio constante daquilo que era a Unidade da Brigada de Transito, hoje fraccionou-se, pois pertence aos comandos territoriais e nestes cada um faz à sua maneira”.
Quando questionado sobre que medidas poderiam ser tomadas para inverter a actual situação, fonte interna é incisiva em declarar que, “a nível nacional vai haver alterações e sabemos que não vai demorar, já que, a presente situação é incomportável por muito tempo. As eleições podem adiar algumas decisões, pode ter sido dito às pessoas para se aguentarem, mas com o descontentamento que há a nível do comando geral, isto terá e vai mudar de certeza. Logo que haja uma estabilização do poder político, vai haver acertos necessários nesta remodelação.”
Para se alterar a presente situação, assegura, “ou outro comandante ou uma outra forma de comandar, os militares andam muito desmotivados e não me parece que a melhor forma de fazer o que quer que seja, inclua confrontá-los. A forma como o Tenente-Coronel faz determinadas coisas, fá-lo com o intuito de provocar. Desta forma, acho difícil uma pessoa responsável que cria vícios de comando, alterar o seu método de trabalho. Ele deveria estar mais actualizado, sobretudo, na forma como antes eram conduzidas determinadas situações”, conclui fonte do Jornal Nordeste.


                        Tenente Coronel Fernandes à esquerda

“Não há razões que sustentem tais afirmações”

Tentámos, por diversas vezes, contactar o Tenente-Coronel Fernandes, na semana passada, mas foi ele a entrar em contacto connosco. Em declarações prestadas ao Jornal Nordeste, salvaguarda que, “grande parte das afirmações proferidas não são verdadeiras, o destacamento de trânsito tem, actualmente, o mesmo comandante que tinha em 2008, e eu não alterei, de forma nenhuma, e desde então, a minha forma de actuar, mesmo após as alterações orgânicas admitidas”.

Quanto ao aspecto logístico, o comandante do destacamento realça, “qualquer chefe de serviço tem o dever de minimizar os custos e a obrigação de aumentar a eficiência. Sempre que as reparações dos veículos excedem a capacidade das oficinas da GNR, são enviadas para o representante das respectivas marcas, algumas delas, destaco, com custos bastante elevados”. “Já os pneus, são de marca e características idênticas aos adquiridos anteriormente”.

No que diz respeito à formação, o Tenente-Coronel Fernandes, reafirma, “a alguns militares, é-lhe pedido para cumprir a sua missão correctamente e de acordo com as leis existentes, para o que recebem formação semanalmente”, advogando que, no entendimento do comando, “não há razões que sustentem tais afirmações”, ultima.

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