Incapacitado, mas não incapaz, Joel pedala 10 mil quilómetros pela paz no mundo e pela “causa dos deficientes”
Era uma vez um desportista. Oriundo de uma típica região vinícola, Joel de Bermond vivia entretido no seu pequeno reino, onde se dedicava à agricultura. Já naqueles tempos, aspirava ser um porta-voz da paz aos homens de boa vontade espalhados pelos quatro cantos do mundo. Para concretizar tamanho sonho, organizou um longo périplo, em bicicleta, através da Ásia, para chegar a Pequim. Ele treinou arduamente para esse grande momento, os Jogos Olímpicos de 2008. Mas, uma reviravolta atroz do destino fez com que o sonho fosse interrompido. E pelos piores motivos.
Em pleno treino, enquanto pedalava, foi colhido por um condutor embriagado e deixado para morrer na berma da estrada. Corria o ano de 2006, aquando do trágico acidente que o deixou gravemente ferido e com o crânio desfeito.
Menosprezando todo e qualquer estereótipo, Joel empenhou-se arduamente num corajoso processo de reeducação. Uma habilitação surpreendente que durou mais de 15 meses, em que conseguiu reaprender a usar os joelhos. Perdido para sempre ficou o seu sentido de equilíbrio. Com tremores incontroláveis, o seu lado esquerdo sofre uma semi-paralisia e a mão esquerda inutilizada. O Síndroma de Raynaud também o ataca, um problema vaso-motriz que dá às mãos e aos pés um aspecto frio e pálido.
Sem poder pedalar na sua bicicleta, após aquele ano de esforço intenso, Joel adquiriu uma bicicleta com três rodas ou trike. E deu-se, então, o retomar dos treinos. E com a preparação física crescente, a possibilidade do sonho voltar a ocupar o seu lugar.
Sentindo-se, então, na sua melhor forma, viajou até ao Hemisfério Norte. Na Noruega, foi homenageado pelo governo com uma estátua em sua memória, que Joel inaugurou. Percorreu 14 mil quilómetros, em sete meses, mais concretamente até ao Cabo do Norte, no Círculo Polar Árctico para, depois, regressar a casa.
Bragança fez parte do roteiro deste sexagenário, que só terminará na Coreia do Sul
Neste seu segundo empreendimento, depois do acidente, Joel partiu de Narbonne, uma pequena povoação entre Toulouse e Montpellier, donde é natural, há um mês e meio. Passou por Santiago de Compostela, Chaves e, agora, por Bragança. “Empreendi esta jornada pela Humanidade. Pela paz no mundo e porque sou inválido, pretendo transmitir a todos aqueles que se encontram na mesma situação que é possível”, assegurou o francês, de 63 anos.
De Trás-os-Montes, região que não conhecia, destaca a sua beleza natural com paisagens de cortar a respiração. Mas não lhe agradam as encostas íngremes, que dificultam imenso a sua travessia.
Casado e pai de uma criança, o ciclista dirige-se, actualmente, para a capital, Lisboa, depois, seguem-se os Açores, Canadá, Alasca e Coreia do Sul. Onde dará por terminada a sua longa jornada de 10 mil quilómetros.
Joel de Bermond considera-se a si próprio um “modesto embaixador da paz”. Mas, este antigo alpinista, antes do acidente, havia já percorrido meio mundo. Desde os Himalaias, à Índia, passando por Itália, Croácia, Hungria, Eslovénia e restantes países europeus. Sempre, de bicicleta. A única diferença é que, agora, pedala numa trike. No entanto, a motivação é a mesma. E a força de vontade, cada vez maior. Aos locais que visita, Joel transporta as suas histórias, partilha as suas experiências, conforta todos os deficientes com excelentes motivos para continuarem a lutar e, essencialmente, acreditarem nos seus sonhos. “O meu objectivo é levar uma mensagem de esperança a todos os deficientes do mundo. Em particular, àqueles que sofreram traumas cranianos”, confidencia este símbolo vivo.
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